ARTISTICAmente...

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Vertigem intemporal

Aguarela sobre papel
Watercolor on paper

Colecção particular / private colection

Arte

Dizia alguém que a arte é o que verdadeiramente nos distingue dos outros animais.

A grande aventura do ser humano que é a busca incessante da sua essência primordial, e de um sentido para a sua existência, projecta-o numa sistemática indagação dos mecanismos do Universo e de si próprio, gerando nesse dinâmico processo, uma gradual tomada de consciência desses labirínticos mecanismos. Esta consciência quanto maior e mais profunda se torna, menos racional vai ficando, dando lugar a uma percepção mais universal do micro e do macro cosmos, estabelecendo novas relações com o todo universal. A racionalidade, pelo seu teor basicamente pragmático, só pode ver os factos que estão à tona da materialidade. A consciência de que falo, é, pelo contrário, uma consciência anímica forjada no nosso mais profundo mundo intuitivo, precisamente o mundo onde se captam e decifram as coisas mais importantes para a nossa existência enquanto seres espirituais, que aos poucos nos pode ir revelando e introduzindo no nosso quotidiano, paradigmas existenciais mais consentâneos com a verdadeira sabedoria, e menos alicerçados no conhecimento puro, que nos pode resolver alguns problemas materiais, (infelizmente muitas vezes criando outros) mas não nos ajuda a resolver o que é fundamental: O que verdadeiramente somos e o que queremos .

A arte é, dos atributos do espírito humano, o que melhores pontes de percepção estabelece entre esse nosso mais profundo mundo anímico, e o mundo físico exterior, e vice-versa, possibilitando a construção de diálogos infinitos entre estes mundos, que nos levam um pouco mais além nesta aventura existencial.

Picasso dizia que os computadores não tinham grande interesse, porque só davam respostas. É precisamente aqui que a arte tem o seu espaço privilegiado: a capacidade de se interrogar, de gerar e redimensionar constantemente novas visões do mundo, amplificando o campo de possibilidades de recriação de novos conceitos e novas realidades que se projectam e ganham vida no nosso quotidiano, contribuindo inexoravelmente para o avanço da humanidade.

Faz parte do ser humano, sobretudo do ser humano civilizado, tentar catalogar tudo e forjar explicações para tudo e mais alguma coisa, esquecendo-se muitas vezes que o que é essencial para o nosso equilíbrio emocional deve ser usufruído apenas com a alma, e não a régua e esquadro como muitas vezes sugere o nosso imenso intelecto obeso de super-ego. A arte, em todas as suas vertentes, é uma coisa para ser sentida. O verdadeiro usufruto de uma obra de arte tem sempre a sua génese no nosso lado irracional.

Arte é quando um poeta nos transporta prazenteiramente para mundos oníricos de extrema beleza, com as mesmas palavras que poderiam ter sido retiradas das páginas amarelas ou de um texto de física quântica, e uma vez ordenadas pela arte e fina sensibilidade do poeta adquiriram um significado pungente que nos delicia e envolve emocionalmente.

Poderemos entender na perfeição como pode uma música ser tecnicamente elaborada, mas será extremamente difícil, senão completamente impossível, traduzir em linguagem racional, a infinidade de emoções e sensações despertadas dentro de nós, por um conjunto de sons estruturados de certa maneira, e quando esses mesmos sons alteram a sua disposição e os seus tempos, alteram também, com maior ou menor profundidade, a paisagem do nosso mundo sensitivo.

Quando alguém tenta explicar uma sensação ou emoção a outro, peca sempre por defeito. É como alguém que tenta explicar exaustivamente ao outro por telefone, a paisagem maravilhosa que está a ver numa linda fotografia. A foto não é a paisagem real, assim como a explicação da foto não é a foto, logo o resultado final é que o receptor desta explicação, ficou no máximo com uma vaga ideia da ideia que o amigo teve da fotografia em causa. A paisagem real ficou a milhas de ser compreendida.

Toda a matemática, toda a ciência e linguagem racional do ser humano, nunca serão suficientes para nos conseguirem transmitir fielmente uma simples emoção, pelo facto de usarem precisamente uma linguagem essencialmente racional que se confina a uma mera descrição sempre deficiente dos conteúdos que trata, e é por isso, completamente incapaz de transmitir integralmente os genuínos atributos da emoção que pretende introduzir num outro receptor, que necessitaria de sentir integralmente essa mesma emoção, para ficar com uma percepção mais real da sua essência. Como cada pessoa tem uma estrutura única que reage às influências externas de modo diverso, sentindo também por isso, de modo diferente dos outros, ainda se torna mais distante e difícil estas pretensas explicações.

Arte é degustação pura e simples, é a persistente fabricação do que queremos que venha a ser real, é a procura titubeante do nosso espaço no mundo, é sobretudo prazer e comunicação.

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segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

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